A jogatina no Brasil foi permitida até 1946, quando o presidente em exercício na época – Eurico Gaspar Dutra – assinou o Decreto que proibiu o jogo no país, alegando que eram “nocivos à moral e aos bons costumes” e deixando um rastro de desemprego e um grande impacto na economia das cidades que exploravam os jogos. A população brasileira não foi consultada e não teve como lutar pelos seus empregos e direitos.
Segundo a reportagem da Agência Senado, antes da proibição o país acumulava uma média de 70 cassinos espalhados por diversas cidades do país, eram centros de entretenimento elegantes, com restaurantes, bares, salões de baile e teatro. Grandes artistas faziam parte dos espetáculos, como Carmem Miranda e Orlando Silva. O país vivia um momento satisfatório com geração de emprego e arrecadação de impostos.
Por conta disso, o Brasil viveu anos de proibição e clandestinidade até que em 1993 o país teve a esperança de ver os jogos saírem da ilegalidade, com a Lei Zico n° 8.672/93 e o Decreto Regulamentador n° 981/93, que tornou possível o funcionamento dos Bingos. O artigo 57 da Lei Zico previa a exploração dos Bingos e similares já o art. 47 do Decreto 981/93, definia o que era Bingo.
O objetivo da Lei Zico era o desporto, visava auxiliar o desenvolvimento do esporte e a arrecadação para entidades esportivas. No projeto original não constava o jogo de bingo como modalidade de arrecadação de recursos, mas foram adicionadas emendas que criaram os artigos referentes a promoção de reuniões para angariar recursos para o fomento do desporto. Dessa maneira, era possível que entidades esportivas promovessem bingos. O Decreto Regulamentador n° 981/93 possibilitou que sociedades comerciais explorassem a jogatina como recurso para o desporto.
De acordo com a referida Lei, em seu artigo 57, cada Estado tinha obrigação de fiscalizar a atividade, já o artigo 48 do Decreto previa que as penalidades seriam também aplicadas pelos Estados. Muitos Estados brasileiros foram a favor de regular a atividade como Rio de Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul.
A Lei Zico ainda previa um percentual de arrecadação do total dos recursos destinados à aplicação em projetos ou atividades em favor ao desporto. A regulamentação Estadual também previa esse percentual que variava de Estado para Estado. Nesse contexto, o Rio Grande do Sul reservou o mínimo de 10% do valor total arrecadado para o desporto olímpico e mínimo de 6% para o fomento do desporto; Rio de Janeiro não elegeu nenhum percentual, e São Paulo previu 7% da arrecadação para a entidade desportiva o qual deveria reverter 70% em proveito do desporto no Estado. Durante dois anos que a Lei Zico permaneceu em vigor foram constatadas algumas irregularidades, diante disso foi instaurada uma CPI para apurar os fatos e possíveis erros em concessões de autorizações, ficando evidente a falta de controle quanto aos bingos em operação no país.
Então, em 1995 foi editada a Lei Pelé n° 9.615/1998 que trouxe nova edição ao desporto e não trazia nenhuma menção aos jogos em sua versão original.
Após inúmeros pedidos das entidades esportivas, o bingo foi previsto na legislação. Mas ainda era difícil estabelecer o que era permitido, já que a conceituação de bingos, bingos eletrônicos e caça-níqueis eram de difícil definição. O Estado do Rio de Janeiro tentou definir o que era bingo eletrônico, mas ainda sem compreensão, e assim deu margem a abusos, impossibilitando que o setor pudesse ser explorado de forma consciente e responsável.
Por conta da dificuldade da exploração e confusão quanto ao que era bingo, que surgiu a Lei Maguito n° 9.981/2000, transferindo a maioria das atribuições a Caixa Econômica Federal, numa tentativa de organizar a atividade dos bingos no país, e ainda estabeleceu a proibição na esfera federal de novas autorizações. Porém, enquanto a União estabeleceu a proibição, muitos estados continuaram a legislar, viabilizando a exploração dos bingos e loteria em seu território.
Diante dessa desorganização no país, o Presidente da República em exercício na época, Luís Inácio Lula da Silva, sancionou a Medida Provisória n° 168 de 20 de fevereiro de 2004 que proibiu “a exploração de todas as modalidades de jogos de bingo e jogos de máquinas eletrônicas denominadas “caça-níqueis”, independentemente dos nomes de fantasia, e dá outras providências”. Assim, o jogo foi proibido novamente e se alastrou o caos por todo o país, e diante dessa proibição o jogo voltou a ser ilegal, mas nunca deixou de existir no país, ou seja, a exploração ainda existe de fato.
Dessa forma continuou a vigorar o artigo 50 da Lei de Contravenções Penais, ainda em vigência no Brasil, que visa coibir a realização dos jogos de azar. A Lei de Contravenções Penais foi regulada pelo Decreto-Lei n° 3.688 em 1941, sendo uma das leis mais antigas e ultrapassadas em se tratando de jogos de azar. É evidente que o jogo existe e circula de modo ilegal pelo país. Nesse viés, nota-se que o jogo vem sendo explorado de maneira ilegal, e sua legislação vigente é retrógada e ultrapassada, não estando adaptada a realidade atual.
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